Resenha Objectified

Filipe pensando
5 min readOct 16, 2020

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A longa metragem em formato documentário “objectified” de 2009 traz um conjunto de designers e opiniões que tentam sintetizar o que é o design e como ele se manifesta provocando uma reflexão sobre tudo que o envolve. O documentário não traz o pensamento de maneira linear, ao contrário expõe ao telespectador um emaranhado de informações que vão se conversando ao longo do filme e provocando reflexões mentais de diversos níveis.
Primeiramente o documentário faz uma abordagem mais prática sobre o que é o design e como ele é feito. De forma que provoca a reflexão sobre como tudo que usamos foi pensado por alguém. Dessa maneira a execução de um projeto e o refletir da concepção de um produto no mundo moderno mira a padronização e a produção em série tendo em vista a própria concepção do que é design.
Mas mais que isso o processo leva em conta diversos aspectos, sendo central as necessidades de quem vai utilizar aquele produto e para quê. Nesse sentido a ergonomia e a antropometria são importantes ferramentas para desenvolver uma ideia que seja confortável e para todos. O designer é um solucionador de problemas, bem como o criador de novos problemas e a metodologia está cercado de etapas que vão da delimitação do problema, concepção de ideias de solução, escolha das melhores ideias, prototipagem, execução, testagem, aperfeiçoamento, até chegar ao produto final. Como é colocado por um designer alemão no documentário o design bom é inovador, útil, estético, compreensível, honesto, discreto, duradouro, consciente e sustentável.
A segunda parte do documentário trata de um aspecto mais filosófico e social do design. Do ponto de vista filosófico o documentário lança reflexão sobre como a concepção de um produto não está isolado a sua forma e utilidade, mas também aos simbolismos que envolvem seu uso. Quando usamos uma caneta, por hora esquecemos daquele objeto físico e passamos a sentir sua experiência, a escrita. Nesse sentido, com as transformações lançadas na sociedade as coisas que possuímos passam a ser também extensões de nosso “eu” e de nossa raízes. Através do carro que usamos ou das roupas que vestimos, por exemplo, estamos comunicando aos outros o que somos, mas mais que aos outros estamos afirmando a nós mesmos a nossa identidade.
Do ponto de vista social, o documentário reflete sobre como é paradoxal o design que tenta por um lado ser democrático (para todos), mas pelo próprio mecanismo em que se insere e emerge (o capitalismo), o design acaba por ser excludente. Quando o profissional de design desponta na sociedade, ele se diferencia porque agrega valor ao produto, o designer passa a ser um profissional de valor e quanto maior o custo de um produto, mais caro ele se torna.
Adiante, uma terceira parte reflete sobre o aspecto sustentável do design, que acaba por se relacionar ao seu próprio fazer e as reflexões de âmbito social apontadas. Antes estava limitado ao designer a concepção de um produto e toda a lógica do fazer envolvia inovar e produzir sempre mais. Mas tudo que é deixado para trás vira lixo e isso se torna uma problemática. Em meados do documentário, um Designer americano reflete como não faz sentido estar emergido num mundo de tecnologia e conviver com a estética e formas de um mundo do passado, posicionando ser o design sempre sobre o futuro, sobre o novo. Mas pensar no futuro hoje é pensar no passado, porque tudo que criamos no passado impacta nosso presente e para haver um presente é preciso um pensar sustentável. De tal maneira que não dá para ser designer hoje sem pensar no pós descarte daquele produto que se cria.
Há ainda uma reflexão sobre a extensão do fazer do design do mundo físico, para o mundo virtual. É verdade que hoje passamos a maior parte do tempo nesses mundos virtuais e da mesma maneira que um designer de interiores projeta um ambiente para torná-lo confortável (em todos os aspectos) ao homem, igualmente o mundo virtual é um ambiente passível de relação homem-objeto que provoca, a depender do seu desenho e interação, conforto ou desconforto. Nesse sentido surge o que o documentário coloca como “design de interação”.
Existe um forte apelo para o aspecto relacional do produto e consumidor, e o documentário reflete que os objetos que importam para nós são aqueles que têm um significado. Nesse sentido, o método de design mais atuais incorporam sempre uma conexão empática como fonte de inspiração para determinado projeto. É preciso se colocar no lugar do outro para considerar não somente os aspectos formais, de utilidade, conforto, estético, mas também os aspectos simbólicos que aquela experiência causará a quem o utilizará.
Nesse sentido, a provocação filosófica trazida ao fim do documentário desponta na mente: No futuro seremos todos designers de nossos próprios produtos? e os designers de hoje serão de outra forma “filósofos” que provocaram reflexões e questionamentos sobre a relação homem-produto? Pode parecer utópico, ainda no mundo virtual, mas o mundo físico é moldado cada vez mais de artifícios que permite o consumidor executar seu produto de tal maneira que o designer se distancia cada vez mais dessa tarefa ficando a ele a função de pensar sobre o produto. Hoje é possível vender na internet um projeto como designer e esse projeto ser executado do outro lado do mundo e porque não vender essas ideias e estar livre ao consumidor final fazer as adaptações que o conectem mais da maneira simbólica ao produto que ele vá adquirir? Afinal como o documentário reflete o bom design é aquele (ou deveria ser) duradouro, que melhora com o uso, que enriquece e ainda é sustentável porque não há intenções ligeiras de descarte.
Concomitante a esse documentário, eu sou desafiado a pensar em uma poltrona para minha cadeira de Ergonomia e Mobiliário da faculdade. E esse documentário me abre a mente sobre os diversos fatores que devo considerar. Seja do aspecto mais funcional, em se tratando da ergonomia e antropometria por trás desse mobiliário, até os aspectos mais simbólicos, em se tratando em que experiência eu quero passar para aquele consumidor que vir a utilizá-lo (o conceito). Mas não me limitar a isso. Também buscar um design que seja democrático, buscando materiais de baixo custo para tornar a poltrona acessível, bem como pensar no aspecto sustentável. Será que estarei desenvolvendo algo que o meu consumidor levará para a vida, e se não como devo pensar nos materiais para tornar seu descarte menos agressivo ao planeta? Por fim, quanto meu próprio eu estará transcrito naquele produto final.

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Filipe pensando

vivo tentando ser melhor e sempre sou traído pela ansiedade